Artigo – InfoMoney – Empresas podem ter problemas com renegociação de dívidas na crise; saiba evitar – Por Giovanna Sutto

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O InfoMoney consultou advogados para entender o que o empresário deve ter em mente para não se afundar com mais passivos

Em meio à crise causada pela Covid-19 e à quarentena, empresas de todo país se encontram com imensa dificuldade para gerar negócios. Entre as alternativas para sobrevivência, além de procurar novas fontes de receita, está a renegociação das dívidas, que, se bem feita, pode trazer um fôlego importante.

Mas muitos empresários enfrentam dificuldades para se organizar e conseguir melhores condições de pagamento durante a crise – seja para honrar os compromissos com os credores ou fornecedores ou qualquer outra contraparte dos contratos atuais.

Prolongar prazos, prorrogar pagamentos, flexibilizar as condições, diminuir juros, ou até buscar perdão de parte das dívidas estão entre as soluções para companhias endividadas com pouca receita para quitar os débitos. Isso vale para todos os portes de companhias. Mas, sem planejamento e conhecimento dos termos, essas iniciativas podem se tornar um tiro no pé.

Problemas no radar

Eduardo Natal, advogado tributário e sócio do escritório Natal&Mansur Advogados, lembra que o empresário deve saber de antemão como o valor negociado entra no seu orçamento de médio e longo prazos – “porque tudo o que for prorrogado terá que ser pago em um futuro breve, e não adianta atravessar a crise para ruir no momento de retomada”.

“Principalmente as pequenas empresas, já que, se não pagarem dívidas municipais, estaduais ou federais elas são excluídas do Simples Nacional, de acordo com a Lei Complementar 123/2006”, explica.

A sucessão de fatos é a seguinte: a Receita analisa a base de recebimento e verifica que determinada empresa está inadimplente. Então, emite um ato declaratório pedindo para a companhia regularizar (pagar ou parcelar) os débitos – ou é excluída da faixa tributária.

Vale lembrar que o governo anunciou a prorrogação de pagamento de dívidas federais para empresas do Simples Nacional, dada a pandemia, mas essa medida da Receita inclui débitos municipais e estaduais também. Além disso, se as dívidas nessas esferas não forem pagas, a empresa perde todos os benefícios adquiridos via Simples, inclusive os anunciados via medidas do governo.

“Nesse caso, as renegociações ficam cada vez mais difíceis, porque têm que passar a recolher todos os tributos na forma de Lucro Presumido, tornando o encargo tributário sensivelmente maior. Se [o empresário] não souber disso, pode se afundar ainda mais com passivos”, diz o advogado.

Para companhias do regime de Lucro Real (mais de R$300 milhões de faturamento), a tipificação de perdão de dívida como receita traz riscos particularmente graves, alerta Eduardo Muniz, sócio do Brigagão Duque Estrada Advogados.

Suponha um empréstimo de R$ 100 mil com um perdão de dívida de R$ 20 mil por parte do credor. “Na prática, a empresa deixa de pagar R$ 20 mil. Mas, para a Receita Federal o perdão de dívida é uma receita. Ou seja, o órgão considera que a empresa teve ganho, ainda que não haja ingresso de caixa (“lucro”). Isso acarreta uma tributação sobre esse valor perdoado pelo credor, e a alíquota pode chegar até 43% do perdão da dívida (R$ 8.600). Então, a empresa acha que é uma coisa a menos, mas ainda sim precisará pagar. Precisa ter atenção”, explica.

A instituição credora do perdão da dívida, por sua vez, ganha dedutibilidade do imposto, já que o “perdão da dívida sob essa perspectiva é entendido como perda, o que gera abatimento”, diz Muniz.

Como se organizar

Marcello Lauer, advogado sócio da Grand Hill Consulting, especialista em planejamento e gestão de negócios e membro da Comissão de Estudos de Recuperação Judicial e Falências da OAB Paraná diz que o primeiro passo, antes de mexer nas dívidas, é manter o caixa. “É preciso trabalhar com as opções que existem internamente primeiro: ajustar o caixa, reduzir despesas, aplicar as medidas cabíveis caso a caso. Organizar a casa”, diz.

Para fazer isso, o empresário deve fazer um diagnóstico do negócio: “qual o faturamento, qual a capacidade de pagamento e como o fluxo de caixa da empresa está se comportando”, lista o advogado. Ele também recomenda que não haja comprometimento da liquidez em função da dívida.

“Não pode incluir os seus recebíveis (ou valores das contas a receber) na negociação do passivo. Se a empresa compromete o faturamento e precisa lucrar mais será um problema, já que não há previsão de quanto ou quando vai conseguir uma normalidade de receita dado o cenário atual”, alerta. “Precisa usar outras formas de garantia, como ativos, bens, máquinas e terrenos para negociar com o credor”, diz.

Guilherme Coelho, advogado do escritório Stocche Forbes, indica que, só depois de fazer um trabalho detalhado sobre os contratos financeiros, instrumentos de dívida, garantias possíveis e prazos, o empresário deve falar com as contrapartes e tentar melhor condições. Tudo deve ser feito com agilidade.

“Todo mundo vai reagir com postura proativa diante de tudo o que está acontecendo. E antes de se desesperar um diálogo com o credor ou fornecedor pode dar um fôlego. Quanto mais tempo demorar para fazer isso, pior. O ato de tentar negociar e informar com sinceridade na atual situação mostra, inclusive, boa fé”, afirma.

Mas nem sempre é fácil. Geralmente, o primeiro contato na renegociação de dívidas são os bancos, na tentativa de flexibilizar as condições e aplicar as medidas que já foram anunciadas – e a que muitos dos pequenos empresários afirmam não ter acesso.

Nesse cenário, Coelho admite que as micro, pequenas e médias empresa têm mais dificuldade para acessar os financiamentos em meio às burocracias e garantias muito altas exigidas pelos bancos, já que muitas vezes não possuem um imóvel, terreno, ou bens para oferecer como garantia.

Outro agravante é falta de uma assessoria jurídica individualizada. “Nesses casos, o próprio empresário cuida da parte comercial e da parte técnica sem um auxílio especializado, pelo custo mesmo, seja de um advogado ou de um consultor, o que torna essas empresas mais vulneráveis”, diz Lauer. “Então, terá que estudar e se preparar para uma negociação – compreender sua situação financeira e estudar as possibilidades para não trocar os pés pelas mãos.”

Alternativas

Para quem não tem assessoria e busca renegociações eficientes de tributos, o ideal é procurar associações ou sindicatos patronais, ou seja, uma iniciativa coletiva para fazer o encaminhamento de renegociação da dívida, explica Natal. “Algo coletivo funciona mais que o individual, que fica restrito à letra da lei e a autoridade responsável por avaliar a situação, geralmente, não flexibiliza”, diz.

Lauer lembra que, fora os credores tradicionais, grandes bancos de varejo, as fintechs de crédito, FDICS (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) ou cooperativas de crédito são opões disponíveis principalmente para micro, pequenas e médias empresas que tem menos acesso ao crédito.

“São fontes alternativas de tomada de crédito neste momento. Cada um deve analisar sua posição e avaliar se vale tentá-las”, diz.

Quando a recuperação judicial é saída?

A recuperação judicial (RJ) pode ser uma solução para algumas empresas. Mas como saber o momento de recorrer ao instrumento?

Na prática, uma empresa faz o pedido de recuperação judicial quando perde a capacidade de pagar suas dívidas e quer evitar a falência. É uma forma de reorganizar os negócios, redesenhar passivos e superar uma dificuldade financeira.

Para Coelho, a recuperação judicial é um instrumento que as empresas têm e podem usar. “Uma dica é entender que o timing da negociação é importante. O pedido [de recuperação judicial] não precisa ser surpresa para os credores. Pode ser uma coisa mais bem elaborada para não ser abrupto. É ideal planejar o processo e as grandes empresas tem mais tempo hábil para desenvolver um bom plano no meio da crise”, orienta.

Já Lauer acredita que a recuperação judicial não traz uma solução para o dinheiro que será necessário para empresas sobreviverem pós crise. “Não cria uma estrutura de capital para continuar os negócios, embora ajude na superação da crise”, diz.

Muniz afirma que a recuperação judicial mostra uma fragilidade da empresa, “é um sinal amarelo”. Além disso, é um instrumento sofisticado demais para micro e pequenas empresas, que podem se perder em burocracias envolvidas. “Por vezes, nesse caso, é mais fácil fechar e abrir de novo depois”, diz.

O Brasil vai enfrentar novo cenário a partir dessa crise e as empresas precisam dominar os fatores econômicos financeiros: a estrutura de capital, fluxo e capacidade do caixa, segundo Lauer.

“Precisam entender os fundamentos do mercado e de seus negócios, aprimorar a governança corporativa e financeira – mesmo os pequenos empresários. Precisarão estudar e se adequar. Se esse conjunto de informação for de domínio, será mais fácil conjugar os instrumentos (renegociação, tomada de credito e recuperação judicial, etc) de maneira consistente e consciente e atravessar a crise”, afirma.

Fonte: InfoMoney

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