“Aplaudo a iniciativa da recente Lei Complementar nº 66 do Estado de Minas Gerais, que promoveu uma reorganização nos cartórios e assegurou maior eficiência na distribuição desse serviço”, diz Gambogi

Desembargador

Flávio Boson Gambogi, Desembargador do TRF6 concedeu entrevista ao CNB/MG para falar sobre a estruturação do Tribunal em Minas

O Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) foi oficialmente instalado, em Belo Horizonte, no dia 19 de agosto de 2022. Localizado no Edifício Antônio Fernando Pinheiro, na Avenida Álvares Cabral, 1.805, no Bairro Santo Agostinho, chegou à capital mineira para agilizar o julgamento, em segunda instância, de processos de competência da Justiça Federal de Minas Gerais.

Para falar sobre o assunto, o Colégio Notarial do Brasil – Seção Minas Gerais (CNB/MG), entrevistou o Desembargador Federal do TRF da 6ª Região, Flávio Boson Gambogi que explanou sobre a estruturação, desafios e satisfações de se ter o Tribunal em Minas Gerais, além da avaliação das serventias mineiras.

Gambogi é Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG (1999-2004), especialista em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro/MG (2006-2007) e em Direito Processual pela PUC de Minas Gerais (2008-2009), mestre em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG (2015-2017) e doutorando em Direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa – IDP. Membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político – ABRADEP.

 

Confira a íntegra da entrevista.

 

CNB/MG No último ano, o TRF da 6ª Região foi inaugurado em Belo Horizonte. Qual é a importância do Estado de Minas Gerais ter um Tribunal Federal próprio, com competência para julgamento dos processos decididos em nosso Estado (MG), os quais anteriormente eram decididos pelo TRF da 1ª Região (Brasília)?

Flávio Boson Gambogi – É uma honra enorme poder falar um pouco sobre essa vitória que eu não considero do Poder Judiciário, nem dos mineiros, mas de todo o Brasil, que é a instalação do TRF – 6ª região, que abrange exclusivamente o Estado de Minas Gerais. É um sonho antigo de todos nós mineiros e algo que eu acredito que venha proporcionar um impacto muito positivo para toda a nação brasileira.

O TRF não é um Tribunal de Brasília que veio para Belo Horizonte. E (um Tribunal) nacional com sede em Brasília, que abrangia 13 Estados da Federação mais o Estado de Minas Gerais. Era considerado a maior Corte de Apelação do mundo, sendo que, antes desse desmembramento, contava com cerca de 600 mil processos, dos quais 200 mil foram separados e enviados para Minas Gerais e aqui estão no TRF da 6ª Região para serem julgados.

Portanto, os outros 13 Estados agora se veem desafogados dessa massa de 200 mil processos judiciais que vêm para Minas Gerais para serem julgados. E isso, ao mesmo tempo, é muito positivo para os mineiros que reclamam seus direitos junto à Justiça Federal. Pois o desmembramento desse acervo permitirá maior agilidade do julgamento, das demandas e, acredito eu, com maior qualidade, porque vamos assegurar essa proximidade entre os julgadores de primeira e segunda instâncias e aqueles que atuam diretamente na prestação jurisdicional: os membros do Ministério Público, da Defensoria Pública da União, os advogados e os maiores interessados que são as partes.

Enfim, é algo que mostra relevância do Estado de Minas Gerais para o Brasil, mas também traz um resultado positivo para todos, garantindo o cumprimento dos preceitos constitucionais da justiça como a duração razoável de processos, ou seja, dar ao cidadão brasileiro a melhor justiça possível.

 

CNB/MG Como foi a estruturação do TRF em Minas?

Flávio Boson Gambogi – Existiu um compromisso legal e ético que se mantém que é não desperdiçar ou ter despesas de nenhum centavo a mais do orçamento com a construção dessa estrutura de justiça. E aí foi necessário utilizar a criatividade para montar o espaço, evidentemente, com muito sacrifício. Utilizou-se a estrutura física e de pessoal da antiga Seção Judiciária de Minas Gerais, ou seja, o Tribunal hoje funciona em um dos prédios em que antes funcionavam as varas dos juízes federais, sendo que esses juízes foram realocados nos outros edifícios que antes ocupavam.

Com o remanejamento dos juízes e servidores, foi possível dar ao Tribunal uma estrutura física sem que fosse necessário adquirir um novo prédio e trazer mais custos para o orçamento federal. E a mesma coisa com relação ao pessoal. Os servidores que estão sendo aproveitados na construção do Tribunal, os servidores que estão nos gabinetes, nas secretárias e nas atividades meio e fim, são os mesmos servidores da antiga Seção Judiciária de Minas Gerais que foram remanejados e realocados dentro do Tribunal.

Isso tem exigido sacrifício de todos os envolvidos, sem sombra de dúvidas, mas pensando sempre no melhor, que é a consagração desse sonho dos mineiros e a possibilidade de poder entregar a todos a melhor jurisdição possível. Com muita criatividade, com o uso maciço das novas tecnologias e aquilo de mais moderno que temos é o que estamos fazendo para montar essa estrutura do novo Tribunal da república brasileira.

 

CNB/MG Quais foram os principais desafios enfrentados nesse processo?

Flávio Boson Gambogi – É um momento de aprendizado para todos, de sacrifício, não apenas para nós desembargadores, para os servidores e os demais membros da justiça, mas também para os usuários. Estamos contando com toda compreensão e sou bastante grato pela compreensão do Ministério Público, da Ordem dos Advogados, da Defensoria Pública, enfim, da sociedade mineira em geral que entende qual é a dificuldade de se tirar um Tribunal do nada, o qual não existia e de repente está sendo formado.

Os desafios são todos! É difícil de imaginar o que não foi desafiador nesse início, desde a implantação da estrutura tecnológica obsoleta que nós tínhamos e sem um recurso suficiente para modernizar, visto que o Tribunal já nasce 100% eletrônico, sem nenhuma espécie de papel. E esse nascer eletrônico exige-se equipamento modernos, capacidade de memória: lembrando, com reduzido orçamento.

Tivemos muita criatividade e pensando, sobretudo, em remanejamento. Um exemplo foi o remanejamento das varas que funcionavam na cidade de Contagem e foram remanejadas de forma a trazer mais eficiência e aproveitamento do pessoal, dos recursos e dos magistrados. Portanto, vamos caminhar nessa linha: sem diminuir o alcance do Tribunal, mas assegurando o melhor aproveitamento dos poucos recursos que temos hoje a nossa disposição.

 

CNB/MG Como é a atuação do TRF em relação aos cartórios?

Flávio Boson Gambogi – A competência da justiça federal é bastante reduzida em relação aos cartórios. Existem alguns entendimentos, e acredito que eles possam até vir a ser acertados, é sobre quando é necessário formular uma dúvida em que aja interesse da União envolvido, por exemplo: um imóvel da União evolvido nessa discussão. Eu penso que essa questão deveria ser resolvida dentro da justiça federal. Por quê? Qual é a competência da justiça federal? É sobre as questões que dizem respeito a interesse da União. Sendo assim, se há interesse da União sendo discutido em qualquer matéria, seja penal, previdenciária, administrativa… é necessária que seja julgada na justiça federal, cabendo a esta, inclusive, dizer se há ou não interesse da União, desta maneira fixando os limites da Corte Estadual.

Isso acaba reduzindo bastante, com relação especifica aos cartórios, a nossa zona de atuação. A maioria de interesses em discursão nos cartórios envolvem particulares, entidades de direito privado ou outros entes da nossa federação, estados e municípios. É raro que exista uma discussão com interesses da União, mas em havendo, atrai-se a competência da justiça federal para dirimir esses conflitos.

 

CNB/MG Como o senhor avalia os serviços notariais de Minas Gerais?

Flávio Boson Gambogi – Como ex-advogado que sou, até recentemente era advogado e ingressei no TRF da 6ª região por meio da vaga que é reservada ao 1/5 Constitucional, e acredito que com alguma propriedade posso fazer um depoimento elogioso a estrutura cartorária do nosso Estado de Minas Gerais.

Aplaudo, inicialmente, as iniciativas mais recentes no sentido de se realizar os concursos públicos para ocupação dos cargos nos cartórios. Eu acho que é de suma importância e não existe melhor forma de seleção para o ingresso nos cartórios. Isso assegura que os serventuários sejam de qualidade e tenham um compromisso com o estado brasileiro. Eu aplaudo a iniciativa da recente Lei Complementar nº 66 do Estado de Minas Gerais que promoveu uma reorganização nos cartórios e assegurou maior eficiência na distribuição desse serviço dentro do nosso Estado, aglutinando as serventias que tinha receitas muito aquém e incapazes de fomentar o seu funcionamento.

A pandemia gerou uma forçada modernização com a digitalização dos serviços, uma consequência que eu acho importante que fique, trazendo uma aproximação do cidadão com o cartório, facilitando a busca com a prestação desses serviços. Há o desafio de adaptação dos cartórios à LGPD, e eu acredito que Minas Gerais tem caminhado na vanguarda, nesse sentido.

Especificamente sobre a justiça federal e os casos que estão sob a minha competência, que estou aqui, dentre outras matérias, responsável pelo julgamento dos temas das matérias criminais, aplaudo a iniciativa do CNJ, através do Provimento 88 que obriga os cartórios a informarem ao COAF as transações com valores exorbitantes, por assim dizer. E me parece que os cartórios são hoje os entes que mais fomentam o COAF com esse tipo de informação, sendo muito importante para que os órgãos de segurança, como a Polícia Federal e o próprio Ministério Público possam buscar promover a investigação para o bom uso dos recursos, evitando crimes como a lavagem de dinheiro.

 

Fonte: Assessoria de Comunicação – CNB/MG